sexta-feira, 18 de junho de 2010

Maria e A Nuvem de Maria



Maria, triste, queria pular a nuvem. Ela, em cima da nuvem mais fofa e branca daquele céu de um azul forte e claro, queria dar um pulo. Só um pulinho. Ver se a cor do céu mudaria lá da outra nuvem; talvez dessa outra nuvem o ar pudesse ser um pouco mais úmido, mais gelado, frio. Ela também achava que dessa outra nuvem iria finalmente conseguir ver as casas lá embaixo; casas que já tinha ouvido tantas histórias. Maria ficava imaginando casas de tijolo, com cor de tijolo, com uma porta para entrar e sair, duas janelas acompanhadas por vasos de pimentas vermelhas, amarelas e verdes, e claro, um telhado com chaminé! Maria adorava telhados... Nas histórias os telhados eram sempre de cor laranja, mas Maria via com clareza telhados coloridos, uma telha de cada cor. O telhado de Maria tinha mais cores que o arco-íris! – e olha que Maria conhecia bem o arco-íris e as suas cores. Afinal, Maria morava numa nuvem, na nuvem de Maria. Da nuvem de Maria não dava para ver as casas, os tijolos, as janelas e os telhados.
Aaah.... a nuvem de Maria era extra fofa, extra branca, extra macia. Eu nunca entrei na nuvem de Maria, mas era assim que Maria falava de sua nuvem. Ela dizia também que dentro de sua nuvem ela podia flutuar. Sentia o ar esbarrar entre seus dedos dos pés e das mãos, e entre os fios de seus cabelos. Ela sabia respirar a nuvem pelo nariz e fazer sair o ar pela boca do jeito que ela quisesse, por exemplo: em forma de rosquinhas, corações, até livros com páginas, frases, palavras e letras. Tudo feito de nuvem! Às vezes, quando Maria não tinha o que fazer, ela respirava nuvem pelo nariz , soprava sempre uma solução para o seu tédio. Uma vez, ela fez até uma corda de nuvem para pular corda - em cima da nuvem dela, é claro! Mas hoje a nuvem de Maria já não satisfazia mais Maria. Como eu já havia contado, Maria queria pular para o a nuvem debaixo. Ai, que vontade que Maria tinha! Ai, que medo que Maria sentia! Afinal se Maria pulasse de sua nuvem, a nuvem não seria mais a nuvem de Maria. A nuvem, voltaria a ser uma simples nuvem. E todo mundo já conhecia a nuvem de Maria! Como era possível a nuvem de Maria não ser mais a nuvem de Maria? Como seria Maria numa nuvem que não era a nuvem de Maria? Perguntas difíceis para nós, mas muito mais difíceis para Maria. Quantas perguntas para uma menina. Tão jovem, já tinha que pensar, pesar e escolher. Por que Maria não podia simplesmente pular, experimentar a outra nuvem e depois voltar para sua nuvem antiga? Parece simples pensar nessas coisas, em tantas possibilidades, mas a verdade é que tantas possibilidades só existem quando a gente as pensa; quando a gente as pratica, elas se tornam completamente diferentes.
Maria não podia simplesmente pular e voltar, porque a nuvem já não seria mais a nuvem de Maria, e Maria já não seria mais a Maria da nuvem de Maria. Eita! Parece complicado, e até é, mas é simples assim - Maria tinha que decidir, tinha que escolher, tinha que fechar os olhos e viver, se arriscar, experimentar, deixar o mundo que ela já conhecia tão bem, mundo que lhe dava tanto prazer e segurança, mas que agora já não era mais suficiente. Maria com a cabeça já pesada e cheia de nós – nó mesmo, que nem nó de linha, mas no caso de Maria era um nó de neurônios, e sinapses e impulsos – então, Maria com o cérebro todo emaranhado se deu uma pausa de presente. Não pensou, só sentiu e se entregou, e de repente a nuvem ficou vazia, opa! Maria pulou! Maria respirou a sua nuvem e se jogou, se jogou no ar, sentiu seu corpo ir e aterrissar na outra nuvem. Maria pisou num novo ar, mas ainda tinha o ar da outra nuvem em seus pulmões, e assim, sem nem ter reparado, expirou pela ultima vez o ar da ex- nuvem de Maria. Esse ex-ar da nuvem de Maria, um pouco mais pesado, mais denso, mais quente se espalhou pela nova nuvem. Nova nuvem, porque ela ainda não tinha um nome, era nuvem, mas não ainda a nuvem de Maria.
Maria expirou pela última vez o ar de sua ex-nuvem, ao mesmo tempo em que viu todos os telhados lá embaixo. Que incrível! Os telhados, laranja-avermelhados! Peraí – laranja –avermelhado!? Mas Maria tinha certeza que eram mais coloridos, que tinham todas a cores do arco-íris juntas! E agora que conseguia finalmente ver pela primeira vez, a menina via laranja-avermelhado. Primeiro, Maria ficou decepcionada, mas logo em seguida Maria viu as árvores, as flores, o rio que encontrava com o mar – Maria não via telhas coloridas, mas via um mundo todo colorido!!! Tinha verde, azul, amarelo, rosa, vermelho. Maria também conseguia sentir cheiros, o ar era mais misturado, ele era composto por muitas possibilidades, muitos elementos, muitas cores. Maria estava estupefata! Um novo mundo. Era mais fresquinho, mais livre. Maria flutuava sem esforço, quase que sem querer e isso era uma maravilha, porque essa nova nuvem era muito maior do que a ex- nuvem de Maria! A nuvem era imensa e Maria não conseguia ver seu fim, ela não sabia os limites nem as possibilidades. Maria mergulhava, cantava, soluçava de alegria, tudo era novo. A menina nunca tinha sentido aquilo, tudo era novo para aquele seu corpinho com tão pouca experiência. Maria tinha o mundo, na verdade Maria tinha uma nuvem, uma nova nuvem. Maria tinha uma nova possibilidade de estar, de perceber o que estava fora. Maria podia ser uma nova Maria, uma outra Maria - a mesma Maria de antes, com essa nova de Maria agora.

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