sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Dialogo Treino Oi?

A – Você devia tentar pular com mais leveza. Eu sinto o chão tremer sempre que você desce. Chega a fazer cócegas no meu pé.
B – Vai dizer que você não gosta de cócegas no pé.
A – Eu não gosto de você.
B – Por acaso.
A – Não, não. Eu com certeza e por vários motivos não gosto de você. E eu não gosto de acasos.
B – Por acaso, você se segura nas certezas, mas não sabe nem por que. Isso é o acaso.
A – Ai meu deus. Para de falar. Você não me conhece. Eu não tenho a mesma cara, não tenho a mesma leveza que talvez um dia você possa ter conhecido.
B – Exatamente a mesma, com a mesma cara, o mesmo jeito. Dez anos depois e eu te reconheço no escuro.
A – Eu vou sair daqui, você está me inventando. Você está me impondo um eu, para eu mesma. Eu fiz uma escolha.
B – Vai dizer que você não gosta de cócegas no pé?
A – Eu escolhi uma outra possibilidade. Um dia li um livro, consegui me ver na personagem, me vi velha, amargurada e sozinha.
B – Você é jovem, ácida e solitária.
A – Hoje eu sou jovem, doce e completa.
B – Completa de que?
A – Não sei... da vida, de mim.
B – Sei... você vai amargurar porque se sente completa. Tão jovem, e já tão cedo sem espaço para somar.
A - Eu vou sair daqui, você está me inventando. Você está me impondo um eu, para eu mesma. Eu fiz uma escolha.
B – Pára com isso, pára com esse show, pára de inventar absurdos. Eu estou aqui para te jogar no chão, e em seguida vou embora.
A – Não sei mais o que dizer. Essa conversa já não está mais me fazendo sentido, não consigo dialogar com você. Você me perde.
B – Mas esse não é o propósito da vida.
A – Hã? Não entendi.
B – Se perder.
A – Se perder do que? Eu estou me perdendo.
B – Então você está se propositando na vida.
A – Não existe.
B – O que? Você está querendo inverter é?
A – Não existe propositando, eu te explico e você se encontra. Eu já não me lembro mais o que estava me perdendo.
B – O propósito. Se perder.
A – Me perder?
B – Esquece, você é uma que mesmo se perdendo não vai nunca conseguir se achar.
A – Você está me confundindo.
B – Que bom. Já é um começo.
A – Começo de que?
B – Qualquer coisa.
A – Que ótimo. Você é mesmo brilhante.
B – O começo de qualquer coisa não é para qualquer um não.
A – Mas para mim é?
B – Não, para você está sendo, mas já já, já pode não ser mais. Fica esperta.
A – E o que é que eu tenho que fazer então?
B – Nada.
A – Muito difícil isso tudo.
B – O nada deveria ser muito fácil. Mania nossa de querer fazer do nada qualquer coisa, só para dizer que é coisa.
A – Muito difícil isso tudo, sobre o nada e a coisa e a perda. E eu?
B – Você o que?
A – Quem que eu era?
B – Não sei. Mas tanto faz.
A – É né...? Tanto faz.
A já desnorteada, perdida, desequilibrada, cai no chão sozinha. B só olha em silêncio. A jogada no chão olhando pro teto, daquele jeito permanece. B vai embora.

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